quinta-feira, 27 de agosto de 2015

“JANÓ”




Renato Maurício Basso

Collor se comportou de modo diferente ao sabatinar Janot, a quem chama de “janó”, talvez em alusão a “nó em pingo d’água” ou espertalhão. A ironia era a mesma, a raiva destilada em seus olhos de psicopata também, mas o ataque pessoal contra Janot não se fez presente desta feita. Não ouvimos ele qualificar o sabatinado, cara a cara, olho no olho, de fdp, fascista ou tosco, como o fez em plenário dias atrás.
Será que lhe faltou coragem ou sua assessoria o orientou para que pegasse mais leve, alertando-o que muita gente está falando que malcriação tem lugar no boteco, no lupanar e não no Senado Federal? Ele não sabe disso, é comum não se saber certas coisas.

Evidente que Janot não iria revidar provocações de baixo calão, nome feio e impropérios contra sua pessoa, para não ter que se dar por impedido ou suspeito no processo que fez debutar contra o senador, disso Collor não precisaria ter medo.

Menos mal que não assistimos à reprise daquela pouca vergonha e não precisamos nos indignar mais uma vez com a forma vulgar que identifica aquele senador.

Mas, apesar da incisiva inquirição do Fernando e de algumas alfinetadas do PT e do PCdoB (submissos úteis que apontaram Gilmar Mendes como prevaricador por engavetar processos e Janot como seletor de  acusações), ordenadas pela presidenta, Janot foi aprovado pela Comissão que o sabatinava no Senado.

O que mais me chamou a atenção naquela sessão, todavia, foi a figura do próprio sabatinado durante o ataque de Collor. Até que se saiu “mais ou menos bem”, em que pese a insistente coçada no nariz e as olhadelas para aquele que presidia o ato. Pareceu meio incomodado naquele momento, não a vontade. Naquele momento não convenceu ao responder que tinha alugado, sim, uma mansão no lago Paranoá, por R$63 mil mensais, para atividades do Ministério Público Federal, ele próprio.

O problema com essa mansão é que após três meses de vigência do locatício, “descobriu-se” que a legislação distrital não permite atividades comerciais ou burocráticas lá, que é um bairro estritamente residencial. Collor apresentou documentos e Janó, a meu ver, quis dar nó em pingo d’água, quando se defendeu dizendo que, realmente, só se flagraram da situação ilegal quando do momento da mudança, da ocupação do imóvel. Mas aí já se tinham passado três meses desde a assinatura do contrato e lá se foram R$189 mil reais, dinheiro público, pelo ladrão. Só então, antenou-se para a porcaria que fez e disse que já foi ao Judiciário para tentar rescindir o contrato. Vai perder a ação e pagar multa rescisória mais honorários advocatícios porque o proprietário, seja lá quem for, não tem culpa de nada. Quem deveria ver com antecedência se no Lago Paranoá pode, ou não, funcionar o escritório do Janot, é ele próprio. Não colou... Ah, mas a mansão tem uma bela piscina e ampla área de lazer...e o preço? Até que não está muito alto...

Outro episódio que não me agradou foi a contratação de uma empresa para administrar a campanha do Procurador-Geral da República a sua recondução ao cargo. Ele não negou. Convenhamos, será que o povo tem que pagar a campanha do Janot para que ele continue no cargo que ocupa? Não gostei. Cheira a maracutaia porque ele mesmo está denunciando políticos que fizeram campanhas de forma ilícita. Quanto foi mesmo que gastamos com isso?

Collor, por sua vez, apresentou documentos a respeito e indagou ao nariz incomodado dos motivos que o levaram a contratar um dos sócios de tal empresa para assessorá-lo diretamente na Procuradoria, tudo pago por nós. Mesmo diante do documento flamejado pelo senador, disse que o fulano não era proprietário da empresa e que, como se trata de bom profissional, não havia problemas na contratação.

Suas explicações mais uma vez não me convenceram e quando lembro que o cidadão foi indicado por Dilma para continuar no cargo, me dá calafrios.

No final, já sem a pressão de Collor, esparramou-se em frases de efeito moral, em necessidades de cumprimento às leis, em imperiosa obrigação de conter a corrupção, em paladinagens que a mim só ofertaram dúvidas. Infelizmente. Gosto das coisas claras.

A esta altura da vida o ser humano já não mais me surpreende com suas atitudes, então a minha infelicidade ao ver o discurso de Janot não foi  surpresa, foi sentimento de impotência mesmo.

Gostaria de ver sua recondução condicionada à elucidação dos fatos trazidos à baila por Collor, mas, mais uma vez infelizmente, na política brasileira a coisa não funciona assim e tudo vai a roldão porque não se podem parar as acusações na Lava-Jato numa hora dessas. A Dilma, se não o indicasse, estaria demonstrando temor de ser por ele denunciada e a oposição, se não o aprovasse na sabatina, também. O Collor já está denunciado, então pode berrar. Que barbaridade!

É, se formos esclarecer tudo, a engrenagem política, nos moldes que aí estão, se quebra e muita gente vai se ver com o Judiciário.

O Collor, raivinha de chiliques e ataques pessoais, maroto, tem culpa no cartório, assim como a Dilma e o PT que dispensam divagações, agora, o Janot com essa ladainha moralista sem me convencer da moralidade das suas contratações... Falta dizer que a briga que Dilma comprou contra Collor ao reindicar Janot é coisa pouca, são dois decadentes, não vale a pena perder tempo com isso.

Só um bom vinho pra alegrar. I see You.

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JANOT RECONDUZIDO: NOVA REPÚBLICA MORREU, NOVO PAÍS ESTÁ NASCENDO.

Luiz Flávio Gomes

– Depois de sabatinado durante mais de 10 horas e de ter enfrentado as grosserias e contumélias do senador neofeudal chamado Collor, o Senado aprovou a recondução de Janot à Procuradoria Geral da República. Algo surpreendente diante da Operação Lava Jato, que está levando as elites políticas, administrativas e econômicas aos bancos dos réus. A postura de independência de qualquer órgão investigador ou judicial é perturbadora para os donos do poder.

– Não fosse o forte apoio que a sociedade e a mídia estão dando para a atuação dos órgãos investigativos e judiciais, seguramente Janot (o perturbador) não seria indicado e aprovado. O velho já morreu e o novo está nascendo. Não há por que não lutarmos por uma diferente República, acentuadamente Ética. O Brasil precisa ser passado a limpo (dentro do Estado de Direito).

– Duas tarefas urgentes: (a) cabe a Janot mostrar sua imparcialidade e objetividade, processando todos os políticos implicados comprovadamente na Lava Jato. Só assim convencerá a todos da falsidade do chamado “acordão” anistiador, que seria manobrado pelo Planalto; (b) Renan foi denunciado há mais de dois anos no STF (é a história da construtora Mendes Jr. Que pagou a pensão da sua filha) e até hoje a Corte Máxima nada decidiu sobre o recebimento da denúncia. Compete ao Procurador-Geral solicitar o apressamento da decisão do STF, sob pena de se dar a impressão de que tenha havido um “acordão” para salvar a pelé do Renan.

– O que todos esperamos de Janot é, dentro do Estado de Direito, a máxima limpeza da podridão instalada no mundo da criminalidade organizada dos poderosos (a Lava Jato é só a ponta do iceberg). Que lute para dar vida para a “certeza do castigo” (penal, civil e administrativo), a grande ausente do funcionamento da Justiça brasileira. Muitos políticos e praticamente todos os partidos estão envolvidos com a corrupção estrutural do País. A solução final passa pela ética, mas sem o reforço da atuação efetiva e independente da Justiça nada vai mudar nos arraigados costumes (mores) da vida pública.

– A recondução do Janot, no contexto crítico que estamos vivendo, para além de ter ocorrido mesmo se sabendo que mais da metade da Câmara dos Deputados (273 parlamentares) é alvo de inquérito e/o ações em tribunais de todo país e que, no Senado, são 45 os senadores investigados ou reús (cf. O projeto Excelências, da Transparência Brasil) (cf. Ilmar Franco), tem um significado mais profundo: é mais um sinal inequívoco de que a Nova República (1985-2015) está morta.

– O Império durou 67 anos (1882-1889); A Primeira República durou 41 anos (5 de ditadura civil-militar + 36 de República Oligárquica); A Segunda Ditadura (1930-1945, de Getúlio Vargas) durou 15 anos (República Nova + Estado Novo); a República Populista e Patricial (1946-1964) durou 18 anos (com governos de Dutra, Juscelino, Jânio Quadros e João Goulart); a Terceira Ditadura civil-militar (1964-1985) durou 21 anos; a Nova República (1985-2015), da redemocratização, durou 30 anos.

– A Nova República já morreu, porque falidos complemente o sistema político, a ética, a integração social (socialidade), a economia etc. Só resta seu sepultamento, que ninguém sabe quanto tempo vai demandar. No tempo da ausência de consciência ecológica se dizia que matar o elefante era fácil, difícil era enterrá-lo. A Nova República é um grande elefante! Temos que enterrá-la e refazer nossa organização social.

– Todos os países prósperos contam com instituições fortes (políticas, econômicas, jurídicas e sociais). A recondução do Janot tem também esse significado, de fortalecimento institucional. Isso era impensável até pouco tempo, quando os senhores neofeudais, donos do poder e da dominação, desfrutavam de absoluta impunidade nos seus crimes cleptocratas. Ninguém pode estar acima da lei em uma República Ética. Esse é o novo horizonte de esperança. Vale a pena lutar por ele.

AUTOR: Luiz Flávio Gomes
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas]
Fonte: http://professorlfg.jusbrasil.com.br/…/janot-reconduzido-no…
foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil