sábado, 31 de janeiro de 2009

"EPISÓDIO: EU ODEIO TRAÍRA"

EPISÓDIO: EU ODEIO TRAÍRA
Cesar Techio Economista – Advogado
cesartechio@yahoo.com
Não posso negar. Escrever estas crônicas é um prazer que inebria, em especial quando mergulho em companhia do silêncio, nas escuras madrugadas, perfumadas com o resplendor da luz noturna que abraça pensamentos, fazendo-os fluir e flutuar nas ondas de lembranças doces e amargas. A vantagem é que toda a crônica pode converter-se em poesia, livre para criar figuras, sonhos, críticas, autocríticas, fantasias, simbologias. Livre pensar, assim como nesta crônica, cujo título sugestivo precede a reflexão e vai dando o norte do que segue adiante.
Mas, as crônicas também devem dizer da ácida e acre realidade, mais nas entrelinhas do que nelas, porque o cotidiano quase sempre demonstra a distância estelar entre o ineducado analfabetismo comportamental dos homens (mesmo daqueles que possuem grandes diplomas) dos bons ensinamentos que os pais lhes ensinaram desde o berço.
Dos horizontes mais amplos da vida, muitos se perdem e, qual burro de canga, se lançam num frenético caminhar, sempre olhando o milho a frente. Para eles, sempre os outros são os errados. O espelho não lhes incomoda devido o ciúme, inveja, prepotência, falta de humildade, ganância... Que lhes obnubila a visão e impede de vislumbrarem o evidente campo da ética, da moral e dos princípios que lhes obrigam ao respeito e ao amor incondicional pelos outros.
Enfim, porque afinal tantos enleios e tropeços nas relações sociais, na vida humana, senão pela quebra reiterada da palavra, pela traição a promessas feitas, pelo egocentrismo de um modelo de vida que despreza valores como a solidariedade, a cooperação e o amor? É bem verdade que somos humanos e erramos. Certamente por este motivo, como expressão de justiça imanente, há imperiosa necessidade de afastarmos radicalismos. Bem como li nas escadarias do escritório de um admirável advogado desta cidade: "Summum ius, summa iniúria" (“supremo direito, suprema injustiça”).
Daí a lição de Sêneca de que: “Assim, em certas ocasiões, será conforme à justiça não restituir o depósito, não cumprir a promessa, desconhecer a verdade e a fé empenhada.... A alteração dos tempos e das circunstâncias levam à alteração da verdade”. Ou ainda a pregação de Santo Agostinho, nos Sermones ad Populum, sermão n. 113, de que: “não mente aquele que promete alguma coisa e não faz ou executa, se para isso algo sucedeu que impediu o cumprimento da promessa, ao contrário de falsidade convincente”.
Na mesma linha São Tomás de Aquino, na Suma Teológica: “se mudaram as condições das pessoas e dos atos. Pois, como diz Sêneca, para estarmos obrigados a fazer o que prometemos é necessário que todas as circunstâncias permaneçam as mesmas. Do contrário, não mentimos quando prometemos, pois prometemos o que tínhamos em mente, subentendidas as condições devidas. Nem somos infiel à promessa pelo não cumprir, pois já as condições não eram as mesmas. Por isso, o Apóstolo não mentiu por não ter ido a Corinto, como prometera, pois obstáculos sobrevenientes lho impediram”.
Assim, a quebra da promessa de casamento eterno transformado em brigas diárias, o término de namoro sob ameaça de morte de um dos genitores, o fim de sólida amizade diante de comportamentos contraditórios, o descumprimento de votos de castidade que negam a natureza humana, etc, não se afigurariam traições. Mas..., as traições às instituições teriam o mesmo benefício? Neste caso, a análise deve ser feita sob as lentes agostinianas da “falsidade convincente”. De qualquer forma fico com a lição de Neide de Azevedo Lima, uma das maiores cronistas do país de que, se alguém lhe trai ou aborrece, seja prático, preserve sua alegria de viver, não tenha dúvidas, não perca tempo odiando e/ou se lamentando: imediatamente vire-lhe as costas. Esqueça-o e parta logo para outros relacionamentos.