quarta-feira, 28 de março de 2012

“PINHEIRINHO AMERICANO”



Cesar Techio - Economista – Advogado
cesartechio@gmail.com

Todo mundo sabe que o pinheirinho americano, cientificamente conhecido como Pinus Elliotti, causa graves impactos ambientais, sendo considerada uma espécie invasora. A espessura de serrapilheira ao seu redor traz danos à germinação de espécies em estágio inicial de desenvolvimento, principalmente de indivíduos jovens sendo que, no Brasil e na nossa região, o pinheirinho americano está registrado como invasor de ecossistemas abertos (Fonte: Anais do IX Congresso de Ecologia do Brasil, 13 a 17 de Setembro de 2009, São Lourenço – MG). Com baixa durabilidade e baixa resistência ao ataque de organismos xilófagos, tais como, fungos emboloradores, manchadores e apodrecedores, cupins, brocas de madeira e perfuradores marinhos, o pinheiro americano é uma verdadeira degraça para a natureza.

Nas várias facetas da vida social encontramos uma realidade parecida com a do pinheirinho americano: um mundo de excessiva competitividade, que se reflete no individualismo, no egoísmo, na falta de humildade e no afã de êxito a todo custo. Mesmo que isso implique em pisar nos outros, em sufocar familiares, filhos, esposa, esposo, amigos, companheiros e as pessoas em geral. Um ambiente de castração, empáfia e prepotência é típico de personalidades centralizadoras a partir das quais se formam os ditadores e a tirania contra a família, o povo, as instituiões e a máquina pública. Uma simples anatomia sobre o pinheiro americano e o quanto ele se assemelha ao agir de tantos, no cotidiano, dia após dia, ano após ano, nos remete a análise das vitrines da sociedade, nas quais o abuso em busca do poder pelo poder, transparece de forma nem sempre muito clara.

A excelência no bem viver consigo e com os outros deve ser incentivo a que as pessoas se distingam por sua capacidade de trabalhar juntas, de serem sensíveis uma para com as outras, a estarem comprometidas no serviço aos outros, na ajuda mútua, no estímulo a que os mais jovens também tenham seu espaço. Como voce espera ser respeitado pelos jovens, se não os respeita? Esta perspectiva não prospera com atitudes egoístas, com emulação democrática fundada num passado de desencontros, de tristezas e insucessos. Muito menos na mostra de superioridade de qualidades pessoais, comparativamente com a dos outros. Mas, com a dinâmica da disponibilidade, da prestimosidade, da predisposição de ajudar as novas gerações e a garantir-lhes práticas de vida que levem à comunhão e à felicidade.

Nosso “ecossistema” social me deixa com a profunda sensação de que ninguém pode depender exclusivamente de si mesmo porque quase nada se pode fazer sozinho. Se é assim, olhe para o seu lado com amor, compaixão, com alegria interior. Encontre seu amor, sua amada, seu amado, seus amigos e dê a eles um grande abraço. Transmita amor, compreensão, solidaridade e permita que cresçam ao seu redor se realizando como pessoas independentes, de personalidade própria. Não mate o sonho dos que vivem ao seu redor. Faça, urgentemente, com que se sintam amados e respeitados. Jogue fora o pinheirinho americano que existe dentro de voce.

Pensamento da semana: "Projetar Brasília para os Políticos que vocês colocaram lá, foi como criar um lindo vaso de flores prá vocês usarem como pinico. Hoje eu vejo, tristemente, que Brasília nunca deveria ter sido projetada em forma de avião, mas sim de Camburão". Oscar Niemayer.

segunda-feira, 26 de março de 2012

A GARÇA E O DILÚVIO


Divulgação/TJRS
Por Afif Jorge Simões Neto,
magistrado em Porto Alegre-RS
Fonte http://www.espacovital.com.br/

O que pode querer da vida aquela garça tão branca no meio do arroio tão imundo? Pára, olha para um lado, bate as asas para outro, dá uma passada rente ao sumo do pequeno caudal, interrompe o voo e volta ao mirante sombreado por um salso-chorão, limpando o negrume do bico nas penas, a cada retorno de revoada.

Um resto de bando navega baixo e arrogante, seguindo o canal da sanga rumo ao Guaíba, arrancando folhas da grimpa do jacarandá lindeiro ao seu posto de observação.

Ela bem que poderia seguir a parentalha, estar longe do Dilúvio de águas podres, enfeitadas por garrafas de plástico e pneus velhos. Ali não tem mais peixe ou qualquer outra espécie de alimento que lhe reduza a fome. Embaixo daquele líquido gosmento ninguém mais respira, ninguém mais pulsa.

Ainda assim, com toda a liberdade dada por Deus em forma de pluma, prefere ficar pela volta, caminhar paciente, olhar plácido, buscando sabe-se lá quais intentos.

Pois desse jeito me sinto nesta cidade enorme e de alma tão perdida. Procuro-me com uma frequência cada vez mais intensa, mas não consigo me localizar no mapa abstrato de um povo disforme e atônito. Por dentro, uma tentativa de fuga, um apelo de menino que perdeu os seus brinquedos levados pela enchente. Pelo lado de fora, uma aparência resignada, um grito tampado.

Mas pouca importância se me dá de tal desassossego. Um dia, seguindo o apito do velho trem fumador de palheiro que se movimenta ao longe, batendo os tamancos, voltarei para a minha aldeia, para o meu açude envidraçado que, de tão azul, parece feito de céu.

E aí a garça do Arroio Dilúvio será minha convidada para mudar de pesqueiro. Com direito a escolher abrigo e canhada e a ter um ribeiro só para ela. Quando avistar algum taquiri garboso voejando rumo à Capital, dirá em versos, batendo com a asinha no peito: “Agora sou dona do ninho que eu mesma fiz. Passeia nos matos vizinhos mais um pássaro feliz”.

Afif@tj.rs.gov.br

quarta-feira, 21 de março de 2012

“NO CAFÉ CENTRAL”


Cesar Techio - Economista – Advogado
cesartechio@gmail.com

No café da Marisa, no centrinho, entre uma conversa e outra, conjecturas sobre o futuro, costuras informais típicas de tempo pré-eleitoral, repentinamente percebo o movimento das horas, o tempo escorregando pelos dedos das mãos, o fluxo mutável das estações, a fragrância de mais um Outono que chega e me assombra. O café central sempre ajuda a espantar a impressão de que vivemos engaiolados, no escritório, no trabalho, nos vínculos sociais, nas circunstâncias pessoais, institucionais, nos contratos emocionais. Um vislumbre momentâneo da efemeridade da vida e da urgência de vivê-la intensamente, a cada cafezinho, a cada olhar furtivo, discreto, me convence de que tudo o que a existência possui de melhor, deve ser vivido. Todos os prazeres, todas as flores, todos os vinhos, todo o calor do corpo, sem nenhum conflito, nenhuma culpa, sem perda de tempo, sem medos e constrangimentos.

A dignidade de ser feliz tem vínculos com a liberdade de poder decidir o rumo da própria vida, a quantidade de açúcar no próprio café, sem necessidade de conselheiros, gurus, “amigos da onça”. Ser o líder dos próprios sentimentos, dos prazeres a serem vividos, da consciência da beleza das estrelas, da própria espiritualidade e do Criador, transforma uma ovelha, bobona e carente de quem a defenda, num leão. Mentalmente atrasadas, ovelhas sempre dependem de quem as oriente. Ajustam-se a quaisquer conselhos convenientemente preparados por aqueles que lhes querem tosquiar. E, pior de tudo: não tomam café. Nem vinho no começo do Outono, mesmo um Carménère do Vale do Colchagua acompanhado por um bom queijo e uma linda companhia.

Ovelhas não tem gosto próprio, são fofoqueiras e vivem de comparar. Possuem uma necessidade ímpar de diminuir, desprezar, falar mal dos outros, de comparar. Comparam o tempo todo. Quando veem alguém mais bonito, se acham feias. Quando encontram alguém de bem com a vida, se acham infelizes. Quando se deparam com alguém mais alto, se acham baixas. Ao verem alguém bem vestido, se acham maltrapilhas. E por isso criticam, “metem o pau” sem qualquer fundamento para tentar destruir. É a psicologia do incendiário: “O sujeito é infeliz e mete fogo no prédio para ver os outros também infelizes.” Recheado por estes pensamentos (aqui transformados em crônica, ao vivo e em cores, à mesinha do café) perscruto o vai e vem das pessoas na rua central da cidade e, observo ao amigo que me acompanha, que até mesmo uma ação trivial, comum, como a nossa, a de tomarmos um cafezinho enquanto escrevo esta crônica, conquanto feito com amor, pode estancar o tempo e nos envolver por um sentimento de satisfação, plenitude e contentamento.

Pensamento da semana: “O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.” Fernando Pessoa.

quarta-feira, 7 de março de 2012

POR PURO PRAZER



Cesar Techio
Economista – Advogado
cesartechio@gmail.com.br


Perguntei ao coração, se aqui poderia deixar fluir as emoções mais secretas, aquelas recônditas, ocultas, encobertas e que navegam no dorso de músicas que falam de amor. Escreva, balbuciou. Quero amar cada toque do teclado, cada fio dos sentimentos que desafiam o tempo dos seus cabelos de meia idade. Mas, confesse o que você sentiu ao encontrar esta doce ilusão que tem o nome de mulher. O coração fala como se fosse possível colocar no papel a emoção de perscrutar o brilho dos olhos, dos cabelos soltos, da pele macia, do sorriso terno de uma lembrança estática, de outro coração, dono de outras músicas e emoções. Mas, fecho os olhos, carregado pela letra da música que me assombra e “eu posso sonhar com maneiras de te deixar ocupada. Posso trancá-la, nós guardaremos isso como segredo. Obedeço a sua sentença na minha cabeça. Hoje à noite eu sonharei com maneiras de deixá-la ocupada. Então eu posso trancá-la, nós guardaremos isso como segredo. Tão certo é meu hoje à noite, amor, quando eu fechar meus olhos” (I Close My Eyes. Shivaree).

Então, divertiu-se a mente, sempre racional, pretensamente lógica em cada linha e entrelinha destas colunas: O que vão dizer os leitores, os que esperam, a cada semana o desfile ácido, cítrico, crítico, dos ímpetos que escrevem a quatro mãos, como voce mesmo disse alhures? A hora é da política local, das uniões e desuniões, do raciocínio lógico, conceitos, frases, elocubrações (as vezes edílicas outras etílicas). Entretanto, se racionalmente mantenho o foco quando escrevo, com o coração me apaixono, festejo, celebro voô em rumo incerto envolvido pelos pensamentos lúdicos de quem sonha amar e ser amado. Também me fascinam os desfiles estéticos, intrigantes matizes de vestidos alinhados, colados, o perfume que atiça o libido, a química intensa do desejo mais próximo do corpo e dos lábios. Esse é o show secreto, pueril, com sabor de vinho carmenere e de viver o impensável.

E, desta forma, num mundo onde o amor tem a cor das convenções, das relações sociais, dos papéis acertados, dos deveres a cumprir; no qual um toma o outro como certo e garantido, pelo menos com o coração somos fluídos, renovados, mais amados, mais amantes. Felicidade tem a ver com fragrância das próprias realizações, com as quais podemos fazer muitas coisas que não sejam de natureza econômica, política, jurídica, social, fruto do desejo dos outros e não dos nossos, apenas por puro prazer. Alegrar-se, maravilhar-se com as coisas mais simples, brincar, estar disponível para infantilidades com a pureza de uma criança e, ao voltar, assumir com serenidade as obrigações, é sinônimo de equilíbrio, maturidade e felicidade. Enfim, convenhamos, é preciso viver. E viver, meus amigos e amigas, é amar, dançar, ousar o desconhecido, desafiar as mudanças, necessárias, imprescindíveis e... urgentes.

Pensamento da semana: “Luto pela magistratura séria, que não pode ser confundida nem misturada com meia dúzia de vagabundos infiltrados”. Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça. Revista Veja edição 2.259, circulando hoje.