Tribuna da Bahia por Osvaldo Lyra Publicada em
18/05/2015 07:15:58
Tribuna da Bahia - O senhor deixou o Senado da
República desencantado com a política do País?
Pedro Simon – Não
tinha lógica eu continuar a disputar uma eleição partidária depois de 85 anos
de idade. Uma pessoa como eu, que começou a fazer política lá na juventude, na
União Nacional dos Estudantes, e fez política eleitoral desde quando fui eleito
vereador, em 1959, em Caxias. Eu vi em 62 o golpe que derrubou João Goulart e
se instalou uma ditadura de 21 anos. Em um ciclo de 14 generais nomeados
presidentes plebiscitários, e eu participava da luta, como o povo brasileiro,
que queria a volta da democracia. Hoje nós estamos vivendo em uma plena
democracia. Não há perigo para as instituições, mas eu, que vivi toda aquela
época, nunca vivi um momento tão dramático como estamos vivendo agora. Perigo
de ditadura, de golpe de Estado, não. Mas perigo de uma anarquização e
ridicularizarão, sim. Uma juventude olha para nós pior do que olhavam para os
militares no tempo da ditadura. Hoje ser político é vergonha. Vamos olhar para
onde é que nós vamos. A presidente Dilma não foi falar à TV no dia 1º de Maio
com medo do panelaço. Mesmo ela não indo, o PT fez um programa e o panelaço foi
em cima do PT quando apareceu a imagem dela. Não sabemos o que está acontecendo
e para onde nós vamos. Dilma fez uma campanha de reeleição falando o tempo todo
o que iria fazer. Disse que não iria mexer no direito do trabalhador acusando
Aécio que, se ele ganhasse, iria fazer isso que ela está fazendo. Ganhou [a
eleição] e está fazendo exatamente tudo que ela disse que não ia fazer.
Tribuna – Acredita que a presidente Dilma já se
arrependeu de ter assumido o segundo mandato?
Simon – Pelo
menos, ela já abdicou em parte. A parte econômica, que é a parte complexa e
difícil, ela entregou para o ministro da Fazenda [Levy Vasconcelos], um homem
do PSDB, que está fazendo, com menos sindicância, tudo aquilo que ela dizia que
o PSDB quem iria fazer. A parte política é uma piada. Ela entregou a
coordenação política para o vice-presidente [Michel Temer], presidente do PMDB.
As nomeações estão com ele, e estão saindo ao montão, e nunca, em toda a crise
que estamos atravessando, nunca vimos tanto troca-troca de governo, vota e
ganha Ministério, vota e ganha cargo, como está acontecendo agora. Estão
preenchendo 1º, 2º, 3º e 4º escalões. Estão nomeando Deus e todo mundo para
tentar fazer uma maioria no governo, para tentar vencer essas cláusulas
diabólicas que foram apresentadas. O governo Dilma está perdido, está sem saber
o que fazer. Absolutamente, sem saber o que fazer.
Tribuna - Com a enxurrada de crises que a
presidente enfrenta hoje, o senhor acredita que ela conseguirá sair com poucas
sequelas?
Simon - Frutos
dessas decisões dela ficou provado uma coisa: ela foi um embrulho do Lula. Nem
ela era gerentona, nem uma gênia. Não era. No segundo governo do presidente
Lula, no primeiro dia já era ministra de Minas e Energia. A Petrobras sofre no
comando dela. Saiu do Ministério de Minas e Energia, foi para chefe da Casa
Civil e presidente do conselho de administração da Petrobras. Saiu dali e foi
para presidente da República. Então, tudo que está acontecendo, aconteceu com
uma pessoa, a Dilma. Ministra de Minas e Energia, que comanda a Petrobras, o
presidente é ligado a ela. Chefe da Casa Civil, o conselho da Petrobras que
decidiu a compra em refinaria nos Estados Unidos e ela foi quem presidiu. E
presidente da República. Ficou comprovado que a Dilma não tinha essa capacidade
e condições que o Lula inventou. Não conheço nada pessoal da Dilma. Conheço a
Dilma que foi para o Rio Grande do Sul após deixar a prisão. Eu não conheço
nenhum ato contra ela, uma vírgula contra a dignidade dela. Ela tem uma filha
que trabalha como procuradora, concursada, casada com um advogado que trabalha
no escritório dela lá em Porto Alegre. Agora, por ação, omissão e
irresponsabilidade, ela é a grande responsável.
Tribuna - Como o senhor está vendo essas
investigações da Operação Lava Jato, que investiga desvios de recursos e
corrupção na Petrobras?
Simon – Tem uma
figura [o juiz Sérgio Moro] que, em minha opinião, o Brasil tem que
reverenciar, no Dia da Justiça, com uma estátua em praça pública. Ele só fala
nos autos. Ele não quer aparecer. Ninguém pegou a fotografia dele no julgamento
fazendo pergunta, dando uma declaração. E eu diria que tem mérito também da
presidente Dilma. É verdade que se ela mexesse com isso, a situação ficaria
tremendamente vulnerável. Mas, justiça seja feita, tanto a Polícia Federal,
quanto a Procuradoria Geral da República estão desenvolvendo essa questão.
Agora, o quadro que está aparecendo é cruel. É de chorar. Quando eu era
criança, eu ia para a praça para ouvir que o petróleo era nosso. Criou a
Petrobras e a Petrobras se tornou uma grande potência. De 1500, desde a
descoberta do Brasil até hoje, qual é o fato que torna o Brasil mundialmente
conhecido? As águas profundas. O petróleo a sete mil metros de profundidade.
Atravessando esses sete mil metros, três mil são de gelo. Primeiro se
descobriu êxito, farto. E como é que vai trazer esse petróleo para a bomba da
gasolina? Então, se começou a discutir.
Uma coisa inédita no mundo: um clube das empreiteiras com os malandros que o PT
nomeou. O dinheiro foi para eles e deram uma parte para os partidos. São quase
R$7 bilhões de desvio, sem falar os R$ 26 bilhões de prejuízo pela má
administração da Petrobras, o que ainda é pior. Quebraram a Petrobras, os
irresponsáveis e incompetentes. Fizeram da Petrobras um escândalo mundial.
Tribuna - E como está vendo as delações premiadas
feitas até agora pelos empreiteiros e operadores do Petrolão?
Simon - Genial.
Fora isso, como no mensalão, pouca coisa se conheceu, se descobriu, se viu.
Ouvir beltrano, ciclano, ninguém ia dizer nada com nada. O que o juiz fez? Ele
foi genial. Eu não tenho muito confiança na ação do Supremo Tribunal Federal. O
Supremo tem uma tradição histórica de sentar em cima dos fatos. Nós cassamos o
mandato do Collor no Congresso e o Supremo, quando ele foi processado, arquivou
por falta de provas. Não se tem tradição de o Supremo agir em questões de
corrupção envolvendo gente importante. No Brasil, ladrão de galinha tome
cuidado que vai para cadeia. Agora, quem é importante, tem dinheiro, leva-se
dez anos. Então, houve essa competência. Primeiro lugar, deixou os políticos
para o final. Ele não mexeu nos políticos. Não mexeu nem nos empreiteiros.
Mexeu nos agentes. E essa gente foi contando tudo. Foi uma coisa altamente
positiva. Um cidadão só, do terceiro escalão da Petrobras, devolveu US$100
milhões. O juiz fez exatamente assim. Então, a delação premiada, ouviu essas
pessoas, que contaram onde tinham que contar. Aí, ele ia começar a ouvir os
homens do clube fechado das empreiteiras. O presidente do clube [Ricardo
Pessoa] disse que ia delatar, inclusive sobre o Lula, isso no sábado de manhã.
Na segunda-feira entraram com o pedido de habeas corpus e o relator, na maior
cara de pau, deu o habeas corpus a todos [os empreiteiros]. Aí foram depor e
ninguém abriu a boca. Mas, o presidente do clube aceitou a delação premiada, já
assinou, e vai falar.
Tribuna - O senhor é a favor ou conta o impeachment
da presidente Dilma?
Simon – O
impeachment é muito importante e vamos chegar lá. Mas, não podemos entrar com o
pedido de impeachment agora. Até porque, de certa forma, o Lula fez maldade
quando disse que ela era a gerentona, a mãe do PAC. Ela é uma mulher
importante, capaz, mas não tem essa competência toda. Nos primeiros seis meses
do seu primeiro mandato, ela demitiu seis ministros por corrupção. Mas ela não
teve apoio de ninguém. E não aconteceu nada, nem a imprensa deu apoio. Agora, o
que vai acontecer quando esses fatos forem comprovados, os políticos vão trazer
o Lula e a Dilma para a festa.
Tribuna - Que fim terá o PT com tantos casos de
corrupção, que mancha sua história hoje, senador?
Simon - Eu fui
do MDB. Tive no comando do MDB, ao lado de Ulisses [Guimarães] como primeiro
vice, como secretário-geral o tempo todo. Fui indicado pelo MDB para coordenar
as diretas já. Me considerava um cruzado. O pessoal do MDB era fantástico, de
garra. Nós do MDB só tínhamos um caminho: ir à luta. Ou você se entregava, e
apodrecia se entregando, ou você resistia. E nós resistimos, muitos foram
cassados, muitos foram presos, mas nós resistimos e o povo foi com a gente. O
Brasil nem tem história de partido político e é uma pena. Tem países que têm
partidos de uma biografia notável. A primeira foi o MDB nas Diretas Já. Fomos
para a rua, lutamos, debatemos, resistimos cercados por tanques e
metralhadoras. O PT foi fundado de uma maneira muito bacana. O PT era oposição
e foi maravilhoso. A primeira eleição do Lula, a segunda, a terceira. Ele
perdeu uma para o Collor e duas para Fernando Henrique. Na quarta vez ele
ganhou. Fez concessões e ganhou. Fez a carta aos brasileiros. O Duda Mendonça
transformou o Lula naquele que conhecíamos do PT, do sindicato, no Lula
alinhado, da roupa feita sob medida pelos melhores alfaiates, barba e cabelo
feitos sob encomenda. Era o Lula já preparado. Quando foi oposição foi notável,
mas só não ensinou o que fazer quando chegasse ao governo.
Tribuna - A Câmara, o Senado e a articulação
política estão na mãos do PMDB. O País e o Planalto são reféns do partido?
Simon - O
Congresso não tem voz. Quem manda no Congresso é o Executivo. A pauta do
Congresso quem decide é o Executivo. Manda a Medida Provisória a hora que quer
e como quer. Projeto de deputado e senador fica na gaveta e não tem como ser
votado. Hoje nessa confusão toda o Congresso está sendo analisado. Talvez o
Congresso reaja e passe a ter uma voz concreta. Quando se fala de uma reforma
do poder político, pode ser que disso resulte a vontade de fazer. Não que eu
ache que o pensamento do presidente da Câmara seja o bom, tenho resistência a
ele pessoalmente, mais ainda ao presidente do Senado. Mas, eles estão
desempenhando um papel importante por essa independência. Se não fosse assim,
só teríamos um caminho: era os presidentes da Câmara e do Senado trocando
Ministérios para fazer tudo que a presidente quer.
Tribuna – Senador, o poder corrompe?
Simon - Não
obrigatoriamente, mas da maneira como é feito no Brasil, o poder corrompe.
Corrompeu o pessoal do MDB que ficou lá por nove anos, corrompeu o PSDB que não
soube resistir, e corrompeu o PT, que é isso que está aí. Nós não tivemos
pessoas capacitadas para ser governo, com dignidade para ser governo. Fernando
Henrique, firme, mas uma vaidade doentia fez ele criar a reeleição comprando votos
dos deputados.
Tribuna - Qual o modelo de Reforma Política que o
país precisa hoje e o que o senhor acha que sairá do Congresso?
Simon - Do
Congresso não sai nada de bom se deixar na mão do Congresso. Do Executivo não
sai nada de bom, se deixar na mão do Executivo. Se deixar na mão do Supremo,
não sai nada de bom. Por isso que estou andando por todo o Brasil. Sou um
Teotônio [Vivela] mascarado, mil vezes mais fraco, mil vezes menos competência
do que ele, mil vezes menos liderança do que ele, mas igual capacidade de ideal
e garra. Nós temos que ir para rua. O povo tem que ir para a rua. Tem que
debater essa reforma, debater o que nós queremos para que a discussão na rua
seja exatamente assim: nós queremos um Congresso assim. Queremos um Executivo
assim. Queremos combater a corrupção assim. Desse debate, onde o povo está
presente, participando, tendo voz ativa, sendo gente, como aconteceu o ano
passado. Agora, deve ser feito isso, debater, discutir, participar. Tem que
sair do seu anonimato, da sua comodidade. Dando presença e se isso crescer, se
as universidades, se a OAB, a CNBB, a ABI, se vocês jornalistas fizerem isso.
Vou ser sincero, estamos no fundo do poço. A classe política está zero.
Tribuna - As redes sociais assumem um papel
importante nesse processo por ser uma nova praça pública?
Simon - As redes
sociais são uma verdadeira revolução. Nós vivemos 20 anos com a grande mídia
contra nós, rádio, jornal e Rede Globo, e para resistir foi uma guerra. Hoje as
redes sociais respondem ao jornal da Globo e, na hora seguinte, se espalha pelo
Brasil inteiro. A gurizada sabe o que quer no país inteiro. É verdade que o PT
fez um grupo de milhares de jovens pagos, recebendo instruções para falar mal
do outro lado, bem deles e inventar coisas dos outros. Fizeram isso com Marina.
Mas as redes sociais e os jovens vão desempenhar um importante papel.
Tribuna - O que o senhor deixa para os jovens e as pessoas que se indignam
com o que está acontecendo hoje no país?
Simon - Esse é o momento de quem tem condições ir para a praça, de
convencer sua família, ir para uma reunião do seu sindicato, do seu clube, seja
aonde for, abrir a discussão sobre o que você quer para o seu país. Exija
participar, diga, fale, esteja presente. Fazer como quer, ao invés de ser um
Bolívar e se reunir lá em Brasília e no fim toda essa discussão será um prato
feito que não vai significar nada. E o Brasil, que está no fundo do poço, pode
se tornar um grande Brasil e se tornar um lugar de destaque. É um continente
com as maiores reservas de água doce do mundo, de terras agricultáveis do
mundo, com um povo sereno e responsável, o Brasil será um grande país. O Brasil
precisa ser refundado, e o povo pode fazer isso.
Colaboraram: David Mendes e Fernanda Chagas