Cesar Techio - Economista – Advogado
Os
movimentos de rua espalhados por todo o Brasil apresentam demandas particulares
e isoladas contra a carestia de vida; a inflação que inviabiliza a
sobrevivência; a precariedade do acesso a bens e serviços; a corrupção sempre
presente no sistema político brasileiro; a concentração de poder econômico e
financeiro versus a pobreza das massas; a proverbial capacidade de mentir dos
políticos; o sistema capitalista não distributivo de renda e propriedade, entre
outros. A demanda pela diminuição do valor de passagens de ônibus, transformada
em luta pelo transporte público gratuito, de qualidade e contra o gigantesco
lucro das empresas que prestam este serviço na forma de concessão, foi apenas o
início de um movimento que estabeleceu um novo espaço para múltiplas e
diferentes demandas. O movimento cresceu através de demandas heterogêneas,
diferentes, que se identificam uma com as outras formando uma onda crescente de
descontentamento: o sem teto se identifica com o agricultor explorado, este com
o professor aviltado no salário e assim por diante.
A
partir deste momento, em que se instala uma crise identificada com uma corrente
contínua de várias demandas por cidadania, o discurso deixa de pertencer a um
segmento e passa a ser expressão de todas as situações vivenciadas por todos os
cidadãos. O movimento também possui caráter independente, de natureza civil, com
sua própria forma, com seu próprio sistema de referências, apartado dos
políticos e dos partidos políticos. Aparentemente surgiu sem lideranças
específicas. Alguns jovens apareceram saindo do encontro com a Presidente da
República na condição de responsáveis pelos movimentos nas grandes capitais. Mesmo
diante da proposta de reforma política, ao sair do encontro reafirmaram uma
completa emancipação em relação às leis e estruturas do sistema de direito
estabelecido, o que, a primeira vista faz parecer que o movimento nacional se
alimenta por critérios cegos ou por ausência de critério.
O
certo é que as massas tem personalidade distinta da de seus componentes e a
emancipação do movimento de demandas proporcionado por elas não tem projetos
concretos de construção de políticas públicas. José Renato Soethe, em artigo
publicado na rede social Facebook constata que as ideias e proposições dos
protestos de rua precisam ser organizadas: “Mas, como organizá-las? Para isto,
talvez, a pergunta metodológica é a de como melhor organizar estas
manifestações. A possibilidade de uma melhor organização das ideias,
proposições e demandas depende de uma melhor organização das manifestações.
Como transformar estas contribuições em canais de construção de políticas
públicas? Alguém tem alguma contribuição acerca disto? Eu tenho...”. Então,
resta aguardar a urgente contribuição do professor da Unisinos, uma vez que a
emancipação do movimento sem sujeito, nome ou projeto parece ser
"responsabilidade" do outro, da massa abstrata que caminha pelas ruas
empunhando palavras de ordem no âmbito da subjetividade e, com efeitos
colaterais indesejados por ela mesma, de quebra-quebra, desordem e
desorganização.
Pensamento da semana: Parabéns a
Everson Durgante e a juventude “VemPraRua” pelo movimento pacífico e
propositivo de Concórdia.